Esquizofrenia

O que é?

A esquizofrenia é uma doença mental crónica que afeta o pensamento, a perceção (“sentidos”), as emoções e o comportamento. Estima-se que possa ocorrer em cerca de 1% da população, surgindo normalmente entre o final da adolescência e o início da idade adulta.

Sintomas

O diagnóstico é geralmente feito num período em que os sintomas se tornam mais exuberantes, o chamado “primeiro episódio psicótico”. Em alguns casos, a doença pode surgir de forma mais repentina mas, na maioria das pessoas, ocorrem alterações subtis meses a anos antes de um primeiro episódio e há um declínio gradual no funcionamento habitual da pessoa.

Alguns dos sintomas iniciais que poderão estar presentes são:

  • Isolamento social
  • Hostilidade ou desconfiança
  • Negligência dos hábitos de higiene
  • Diminuição da expressão emocional
  • Sintomas depressivos
  • Hipersonolência ou insónia
  • Discurso irracional ou bizarro
  • Dificuldade de concentração
  • Hiperreactividade à crítica

Existem vários sintomas caraterísticos da esquizofrenia como os delírios, alucinações, discurso e comportamento desorganizado. Uma pessoa pode ter a doença e não manifestar todos estes sintomas, e alguns deles podem só surgir mais tardiamente. 

Delírios

São crenças irrealistas ou fantasiosas nas quais o doente acredita com toda a sua convicção – “ideias fora da realidade” – não explicadas pelo contexto cultural. Por exemplo, a pessoa pode estar convencida que está a ser perseguida, vigiada, filmada, que conspiram contra si, que a querem envenenar ou prejudicar de alguma forma. Podem ainda acreditar que pessoas nas televisões, jornais ou internet estão a comunicar consigo ou que existem códigos secretos em objetos comuns que só eles conseguem descodificar.

Estas ideias invadem e dominam o pensamento das pessoas com esquizofrenia, causando sofrimento, medo, angústia e tensão.

Alucinações

Uma alucinação define-se como o experienciar através dos sentidos de algo que não existe no mundo exterior. Isto é, as pessoas podem ouvir ou ver coisas que não existem ou não estão presentes, como vozes de pessoas conversando entre si ou que se referem ao próprio, insultando-o ou dando-lhe ordens. Podem ver vultos ou imagens de pessoas, com as quais tentam conversar e interagir. Podem ainda sentir cheiros ou sabores estranhos, sentir choques ou bichos a moverem-se na pele ou sentir que os órgãos estão a ser puxados.

Tal como no delírio, as alucinações podem dominar o dia-a-dia das pessoas com esquizofrenia e influenciar o seu comportamento.

Discurso desorganizado

A desorganização do pensamento é um sintoma característico da esquizofrenia. Na prática, pode ser reconhecido pela forma como a pessoa fala. A esquizofrenia interfere com a capacidade de concentração e de manter o curso do pensamento. As pessoas poderão falar de forma incoerente, pouco lógica, responder de forma inadequada a uma pergunta ou passar de um tópico para outro sem qualquer relação entre eles. Podem ainda utilizar palavras inventadas por si. 

Podem experienciar estes fenómenos e referir-se a eles como pensamento enevoado, turvo ou névoa; sensação de bloqueio ou paragem das ideias. Paralelamente, podem ter a sensação de que os seus pensamentos podem ser lidos, roubados, inseridos ou controlados por outras pessoas, ao que se chama de alienação do pensamento.

Comportamento desorganizado

A esquizofrenia tem um impacto importante no funcionamento global da pessoa interferindo na capacidade de se auto cuidar, trabalhar e interagir com os outros. O comportamento desorganizado pode ser identificado como:

  • Declínio no funcionamento global
  • Respostas emocionais imprevisíveis ou inadequadas
  • Comportamentos que podem parecer bizarros e sem propósito
  • Ausência de inibição ou controlo dos impulsos

Sintomas negativos 

Os sintomas negativos da esquizofrenia referem-se à redução ou ausência de determinadas caraterísticas que estão presentes em pessoas saudáveis. Exemplos:

  • Ausência de resposta emocional – face pouco expressiva, tom de voz monocórdico, ausência ou dificuldade no contacto visual.
  • Ausência de interesse/entusiasmo – menor motivação para as atividades de vida diária e isolamento dos amigos e familiares.
  • Dificuldade e alterações do discurso – Dificuldade em estabelecer e manter uma conversação, tom monótono do discurso, respostas curtas e por vezes descontextualizadas.

Sintomas cognitivos

É frequente a existência de alterações da cognição tais como:

  • Dificuldades de concentração
  • Problemas de memória, em particular da memória a curto prazo (memória de trabalho)
  • Dificuldades no planeamento e estruturação de atividades
  • Ausência de crítica para a doença, isto é, uma dificuldade no reconhecimento de que se está doente. Esse é um dos principais fatores que leva ao abandono do tratamento, tendo os familiares e amigos um papel fundamental na promoção da continuidade da terapêutica e do acompanhamento em consulta.

Causas

A causa exata da esquizofrenia é desconhecida. A investigação nesta área sugere que seja causada por uma combinação de vários fatores genéticos, biológicos e ambientais.

Existem vários fatores de risco que aumentam a probabilidade de uma pessoa ter esquizofrenia. Contudo, não se sabe ao certo porque é que algumas pessoas desenvolvem a doença e outras não.

  • Fatores Genéticos: sabe-se que familiares em primeiro grau de um doente com esquizofrenia têm maior probabilidade de desenvolver a doença do que as pessoas em geral. Por outro lado, o modo de transmissão genética da esquizofrenia não está esclarecido. É provável que exista uma combinação de diferentes genes que podem tornar uma pessoa mais vulnerável a ter a doença.
  • Fatores ambientais: parece existir uma maior probabilidade de desenvolver esquizofrenia em pessoas que durante a sua gestação sofreram de complicações da gravidez ou do parto, tais como infeções e desnutrição na gravidez, parto prematuro, baixo peso ao nascer e asfixia no parto. Viver em ambientes sociais de pobreza e grande stress também poderão ser fatores de risco ambientais.
  • Alterações bioquímicas cerebrais: os neurotransmissores são moléculas que permitem às células cerebrais comunicarem entre si. Na esquizofrenia há evidência de uma alteração a nível de diversos neurotransmissores.
  • Uso de drogas ilícitas: As drogas ilícitas, incluindo a cannabis, também foram associadas ao surgimento de esquizofrenia em pessoas vulneráveis. Quanto mais precoce e mais frequente o uso de cannabis, maior o risco.

Diagnóstico

O diagnóstico da esquizofrenia é clínico, isto é, baseia-se em sintomas. É necessária uma avaliação por médico psiquiatra, de forma a apurar as manifestações da doença. Esta informação deve e pode ser complementada com informações de familiares e/ou amigos. 

Não há nenhum tipo de exame específico que permita confirmar o diagnóstico da doença. Muitas vezes são solicitados exames que permitem excluir outras doenças que podem apresentar manifestações semelhantes à esquizofrenia.

Tratamento

A esquizofrenia é uma doença crónica para a qual existe tratamento eficaz que permite melhorar significativamente a qualidade de vida das pessoas com este diagnóstico. É tanto mais eficaz quanto mais precocemente for iniciado.

Os objetivos do tratamento são:

  • Eliminar ou minimizar os sintomas.
  • Prevenir a ocorrência de recaídas.
  • Prevenir ou reduzir a necessidade de consultas ou hospitalizações.
  • Evitar ou reduzir efeitos secundários indesejáveis que possam resultar da medicação.
  • Obter e manter o alívio de sintomas, de modo a que não tenham um efeito negativo na vida da pessoa
  • Iniciar ou retomar as atividades diárias, como por exemplo trabalho, educação, autonomia, relações sociais.

Tratamento Farmacológico

Os medicamentos utilizados no tratamento da esquizofrenia são chamados de antipsicóticos, também conhecidos como neurolépticos. Atuam sobre um neurotransmissor chamado dopamina, cujo excesso provoca os delírios, alucinações e comportamento desorganizado.

O efeito terapêutico pode demorar de 4 a 8 semanas, embora a se consiga a diminuição rápida da agitação e ansiedade nos primeiros dias de tratamento. Após a estabilização da crise aguda é comum o abandono do tratamento, o que deixa a pessoa vulnerável a uma nova crise. O tratamento regular é essencial para evitar futuras recaídas.

Os antipsicóticos podem ser tomados por via oral, através de comprimidos, ou por injeção intramuscular também conhecida como depot. Os comprimidos têm de ser tomados diariamente, enquanto as injeções podem ser administradas em intervalos que variam entre 2 semanas a 3 meses.

Os efeitos adversos destes medicamentos incluem alterações musculares, como rigidez, espasmos e tremores, inquietação e necessidade de estar em constante movimento, sonolência, aumento de peso, disfunção sexual, boca seca, obstipação, visão turva.

Caso surja alguns destes sintomas deve falar com o seu médico e não interromper a medicação.

Psicoterapia

Associado ao tratamento farmacológico, a psicoterapia permite desenvolver estratégias para lidar com os sintomas da doença, trabalhar aspetos da relação com os outros e com a família e promover o reconhecimento da doença e necessidade de cumprir o tratamento.

Reabilitação Psicossocial

A reabilitação integra diversas modalidades terapêuticas como atividades socio ocupacionais, música, dança, teatro, exercício físico e arte. Procura promover a autonomia e o funcionamento global das pessoas a par de melhorar a relação com os outros.

Os programas de reabilitação são individualizados para cada doente e têm particular benefício nos sintomas cognitivos e negativos.

Evolução

A evolução ou prognóstico da esquizofrenia é muito variável. Existem pessoas que têm apenas uma crise aguda da doença, retomam as suas atividades e permanecem com sintomas que pouco interferem no seu dia-a-dia. Outras pessoas podem ter um curso da doença mais grave, com maior dificuldade para retomar as atividades de vida diária, estando mais dependentes de supervisão e apoio.

Sabe-se que quanto maior o número de episódios agudos da doença, mais comprometida será a recuperação a longo prazo. Por esse motivo o foco é na prevenção de recaídas e da adesão ao tratamento.

Como lidar com a doença

Fui diagnosticado com Esquizofrenia – e agora?

A maioria das pessoas com Esquizofrenia recupera sob um plano terapêutico consistente. Muitas delas vão experienciar episódios de agravamento e de melhoria dos sintomas ao longo do curso da doença.

Estar informado, procurar obter apoios e manter o tratamento ajudam a diminuir o impacto da doença. Mesmo que se sinta bem ou que já não está doente, não deve interromper o tratamento. Na verdade, a medicação é a razão pela qual se sente melhor e é exatamente por isso que é prejudicial interrompê-la. Na dúvida fale com o seu médico ou outro profissional de saúde que o acompanha.

Conhecer os sintomas da doença pode ajudá-lo a reconhecer quando necessita de procurar ajuda especializada. Alguns sintomas que podem ser indicativos do início de um episódio psicótico são: alterações do sono, sentir-se ansioso, angustiado, desconfiado ou com medo sem explicação aparente, ter dificuldades de concentração ou ouvir vozes.

À semelhança de outras doenças é importante cuidar da sua saúde e bem-estar. Manter um estilo de vida saudável, praticar exercício físico, ter uma alimentação variada e equilibrada, não fumar e não consumir drogas permitem ter uma maior qualidade de vida, aumentar a energia e a autonomia, e pode mesmo ajudar a combater alguns efeitos secundários da medicação ou sintomas da doença.

Não tenha receio de pedir ajuda especializada. Manter a família e amigos por perto é importante, mas nem sempre é a resposta que necessitamos.

O meu familiar ou amigo tem Esquizofrenia – o que posso fazer?

Os familiares e amigos desempenham um papel vital no apoio à recuperação na esquizofrenia.

Devem oferecer suporte emocional, encorajando o seguimento em consultas e a toma de terapêutica, uma vez que influencia positivamente a recuperação. Podem ainda fazer o acompanhamento nas consultas, de forma a fornecer informações importantes, como alterações do comportamento ou ideias expressas pelo doente, que por vezes não são reconhecidas pelo próprio.

É fundamental garantir que a medicação está a ser tomada de acordo com a prescrição, especialmente após ajuste da terapêutica ou hospitalização. As pessoas com esquizofrenia frequentemente abandonam a terapêutica, o que leva ao reaparecimento dos sintomas.

É importante entender a pessoa e saber responder a comportamentos ou crenças estranhas. Para a pessoa com esquizofrenia, as crenças estranhas (delírios) ou alucinações são reais. Os familiares e amigos devem compreendê-lo e poderão responder que não sentem a realidade tal como eles. Manter uma postura apoiante e calma, não culpabilizante e desincentivando comportamentos inadequados ou perigosos.

Estar atento a situações que possam despoletar ou agravar sintomas, como o uso de álcool e drogas, ou eventos que causem uma grande disrupção pessoal ou social.

Ajude a pessoa com esquizofrenia a estabelecer e cumprir os seus objetivos de vida. Estes devem ser ajustados à realidade, potenciando a sensação de autoeficácia. Uma parte fulcral do tratamento é a potencialização das capacidades da pessoa de forma a restabelecer o funcionamento social e afetivo.

Personalidades com Esquizofrenia

A Esquizofrenia é uma doença que pode afetar qualquer um. Alguns exemplos de personalidades com diagnóstico de Perturbação esquizofrénica são:

  • Vaslav Nijinsky (1889 – 1950) – Bailarino e coreógrafo
  • Zelda Fitzgerald (1900- 1948) – Escritora
  • Veronica Lake (1922- 1973) – Actriz
  • John Forbes Nash Jr. (1928- 2015) – Matemático e Prémio nobel em Ciências Económicas em 1994
  • Lionel Aldridge (1941 – 1998) – Jogador de futebol americano
  • Brian Wilson (1942-) – Músico Beach Boys 
  • Roger (Syd) Barrett (1946-2006) – Músico Pink Floyd
  • Peter Green (1946-2020) – Músico Fleetwood Mac
  • Darrel Hammond (1955-) – Actor e Comediante
  • Elyn Saks (1956-) – Professora universitária e investigadora em Direito e Psicologia
  • Will Elliott (1979-) – Escritor
  • Jack Loyd (1989-) – Actor

Filmes sobre esquizofrenia

Doença mental e esquizofrenia são frequentemente retratadas através de formas de arte. Podemos encontrar algumas obras cinematográficos que abordam a Esquizofrenia:

  • Uma mente brilhante (A beautiful mind), de Ron Howard (2001)
  • O Solista, de Joe Wright (2009)
  • Ilha do medo (Shutter Island), de Martin Scorsese (2010)
  • Pára-me de Repente o Pensamento, de Jorge Pelicano (2014)
  • Simplesmente genial (Shine), de Scott Hicks (1996)
  • Angel Baby (1995), de Michael Rymer
  • O rei pescador (The Fisher king), de Terry Gilliam (1991)
  • Entre o génio e a loucura (Proof), de John Madden (2005)
  • Eu nunca te prometi um jardim de rosas (I never promised you a rose garden), de Anthony Page (1977)
  • Canvas, de Joseph Greco (2006)